O Projeto de Lei Complementar Nº 1943/2023, de autoria do executivo, tramita na Câmara Municipal e propõe a alteração da previdência social dos servidores públicos do município de Florianópolis.
Muitas alterações propostas no PL são baseadas na Reforma da Previdência, em vigor desde 2019, através da Emenda Constitucional 103, que teve um impacto significativo na garantia de uma aposentadoria digna, afetando tanto aqueles do regime geral (RGPS – INSS) quanto do regime próprio da previdência social (RPPS).
O governo Bolsonaro justificou as mudanças com o argumento do déficit previdenciário, embora isso não tenha sido plenamente comprovado, resultando na retirada de direitos previdenciários. A medida foi aprovada no Congresso Nacional após oito meses de debate limitado com as entidades de classe.
Entre as mudanças, a reforma aumentou o tempo de contribuição para aposentadoria, eliminou a aposentadoria por tempo de contribuição, reduziu o valor das pensões e modificou o cálculo da renda mensal inicial.
Para os servidores públicos, a reforma visa acabar com o Regime Próprio da Previdência Social, equiparando-o ao regime geral, e permite que cada ente federado, município ou estado, legisle sobre a previdência.
A seguir, apresentamos uma análise das alterações trazidas pela proposta:
1. Divergências com a EC 103 de 2019
O Projeto de Lei Complementar propõe cobrar contribuições de todos os servidores aposentados e pensionistas que ganham mais do que o salário mínimo.
Isso é pior do que o previsto no artigo 11, parágrafo 4, da Emenda Constitucional 103/2019, que diz que a contribuição será sobre o valor que exceder o máximo do Regime Geral de Previdência Social. Ou seja, quem ganha acima desse limite vai pagar a contribuição sobre uma parte da aposentadoria.
Além disso, o PL muda um pouco as regras sobre quem pode receber pensão por morte. Ele equipara filhos e menores tutelados nesse aspecto, o que não estava previsto na EC.
1.1 Ausência de alíquotas progressivas para os inativos
O texto propõe uma mudança na Lei Complementar 349/2009, que trata das contribuições para o custeio do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS).
Atualmente, o art. 12 da LC estabelece uma alíquota fixa de 14% para os servidores ativos e pensionistas. No entanto, o artigo 149, §1, da Constituição Federal determina que as alíquotas sejam progressivas, ou seja, variem de acordo com a remuneração do servidor ou o valor da aposentadoria de maneira progressiva, de modo que quem ganha mais, contribui mais com o custeio da previdência. Essa medida não foi incluída no Projeto de Lei 01943/2023, o que é prejudicial para os servidores aposentados e no equilíbrio e solidariedade dos servidores no custeio do regime próprio de previdência social.
2. Alterações previstas no projeto de lei
O Artigo 1º mudou o que significa remuneração na LC 349/2009 para incluir o termo “subsídio”, dentre outros, o que é baseado no art. 4º, §8º, da EC103/2019.
O Artigo 2º altera o § 4 e inclui o §5º do art. 4º da LC 349/2009. Agora, se alguém estiver fora do trabalho sem receber pagamento (licença sem vencimentos), pode escolher pagar à parte a contribuição para a previdência que seria cobrada nesse tempo. Se quiser contar esse tempo para sua aposentadoria, precisa pagar até agosto de 2024, mas se não pagar até esta data, não poderá mais contar esse tempo sem pagamento.
Há um problema com isso porque, atualmente, os funcionários já são cobrados pelas contribuições quando estão fora do trabalho, o que pode ser difícil para eles porque não estão recebendo salário. O texto também impede que os funcionários contribuam ou contem esse tempo sem pagamento.
O Artigo 3º propõe mudanças nas regras sobre quando alguém perde o status de segurado. Nas regras atuais, só perde esse status em caso de morte, ausência declarada pela justiça, exoneração ou demissão.
No projeto, propõe-se incluir outras situações, como perda do cargo por decisão judicial, demissão após processo disciplinar e cassação da aposentadoria. Se perder o status por esses motivos, não poderá receber benefícios da previdência, mas poderá usar o tempo de contribuição em outro sistema de previdência.
O Artigo 4º altera o caput e os §§ 1º a 7º e inclui os §§ 8º ao art. 15 da LC n. 349, de 2009. Uma delas, reduz a idade máxima para um menor sob tutela receber pensão. Isso pode ser prejudicial porque muitos jovens podem não conseguir ir para a universidade por falta da renda de um(a) provedor(a). Outra mudança diz que o viúvo perde o direito à pensão caso se case novamente. Isso também se aplica a quem recebia a pensão.
Além disso, o texto propõe um prazo curto para provar que um casal vivia junto com uma família, o que pode dificultar para algumas pessoas que não têm documentos para comprovar. Além de prever que a idade mínima para receber pensão pode ser alterada de acordo com a expectativa de vida, seguindo regras já estabelecidas. Outro ponto grave é que o PL desconsidera união entre pessoas do mesmo sexo, pois considera união estável o observado no dispoto no § 1º do art. 1.723 da Lei n. 10.406, de 2002 (Código Civil), que somente reconhece como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher.
O Artigo 5º incluiu o Art. 6-A uma cópia integral do artigo 24 da EC 103/2019, que diz que não se pode receber mais de uma pensão por morte ao mesmo tempo e define como será feita uma redução se isso acontecer.
O Artigo 6º muda quanto a prefeitura paga para a previdência, aumentando de 17% para 28%. Também muda a contribuição de aposentados e pensionistas, que agora terão que pagar previdência se receberem mais do que um salário mínimo.
O Artigo 7º diz que pagamentos como a parcela recebida em decorrência de cargo em comissão ou função de confiança não serão contados como salário para calcular a contribuição previdenciária, mas os funcionários podem escolher pagar previdência sobre eles se quiserem. Eles têm até 1º de agosto de 2024 para decidir.
O Artigo 8º dá mais poder ao Conselho Deliberativo para tomar decisões importantes sobre o fundo de pensão.
O Artigo 9º muda a organização do Conselho Deliberativo, que administra o fundo de pensão. Diminui o número de membros, o tempo de mandato e muda como são escolhidos.
O Artigo 10 diz que o Conselho Deliberativo será o principal órgão de deliberação e orientação superior do RPPS/Florianópolis.
O Artigo 11 estabelece a composição do Conselho Deliberativo: 3 de escolha do Executivo, 1 do Presidente da Câmara e 4 dos servidores. Todos nomeados pelo Chefe do Executivo.
O Artigo 12 estabelece que o Conselho Deliberativo terá mais responsabilidades, como aprovar planos financeiros e éticos, além de acompanhar auditorias e decisões importantes sobre o fundo de pensão.
O Artigo 13 mudou a composição do Conselho Fiscal, retirando o poder do Sindicato de nomear membros. Antes, o Sindicato tinha direito a escolher uma parte dos membros do conselho, o que passa a não poder acontecer mais caso aprovado o projeto .
A Lei 9.717 de 1998 prevê que os membros dos conselhos precisam cumprir certos requisitos, como não ter condenações criminais, ter certificação comprovada e experiência em áreas financeiras ou administrativas. Apesar disso, a lei atual e a mudança proposta para a previdência dos servidores municipais de Florianópolis não mencionam essas exigências, que não podem ser suprimidas ao nosso ver.
O Artigo 14 aumenta as responsabilidades do Conselho Fiscal, dando a ele mais coisas para fazer, como verificar os resultados financeiros, emitir pareceres sobre as contas e fazer planos de trabalho anuais. Antes, o Conselho tinha outras responsabilidades, como examinar os documentos financeiros e sugerir medidas para resolver problemas.
O Artigo 17 diminui o tempo que a Prefeitura tem para recuperar seus créditos de 10 para 5 anos. Isso significa que se alguém dever à Prefeitura, ela só pode tentar recuperar o dinheiro dentro de um período de 5 anos, em vez de 10. Isso também se aplica ao RGPS, que é o Regime Geral de Previdência Social.
O Artigo 19 muda como é calculada a aposentadoria por incapacidade permanente, copiando a Emenda Constitucional 103/1019. Pelo projeto, o cálculo é feito apenas pela média dos salários, o que é melhor para os segurados.
O Artigo 20 ajusta a idade de aposentadoria compulsória conforme a Constituição Federal. A idade máxima para aposentadoria compulsória pode ser de 70 ou 75 anos, dependendo do que a lei complementar estabelecer.
O Artigo 21 acrescenta uma nova forma de calcular a aposentadoria, considerando a média de 100% dos salários contributivos, seguindo o que diz a EC 103/2019. Pelas regras atuais, é considerada apenas a média dos 80% maiores salários de contribuição, o que era mais vantajoso.
O Artigo 22 reduz pela metade a parcela da pensão por morte que o pensionista recebe, passando de 100% para 50% do valor da aposentadoria. Isso segue o que está na EC.
O Artigo 23 estabelece um prazo de 180 dias para solicitar a Pensão por Morte, o que é mais longo do que os 90 dias do RGPS. Atualmente, não há um prazo definido para fazer o pedido, o que é mais benéfico.
O Artigo 24 permite suspender a pensão por morte temporariamente se houver suspeita de que o dependente teve envolvimento em um crime contra o segurado. Se o dependente for absolvido, todas as parcelas atrasadas serão pagas e o benefício será reativado imediatamente. No entanto, essa suspensão pode prejudicar o dependente inocente, já que o processo pode demorar e ele pode ficar sem renda durante esse tempo.
O Artigo 25 altera a estrutura do Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos do Município de Florianópolis, adicionando um Comitê de Investimento à organização.
O Artigo 26 define as condições para os membros da diretoria executiva deste instituto.
O Artigo 27 muda a composição do Comitê de Investimentos, permitindo que membros sejam designados pelo Prefeito, sem exigir que sejam servidores. Essas mudanças podem ser arriscadas, pois permitem que pessoas sem a devida qualificação profissional sejam responsáveis pelos investimentos do Fundo de Pensão dos Servidores Públicos.
O Artigo 28 revoga várias partes da lei que foram modificadas pelos artigos anteriores.