Na segunda-feira (4), o vereador bolsonarista Maikon Costa (PL) teve seu mandato cassado com dezessete votos favoráveis ao seu afastamento da Câmara Municipal de Florianópolis, incluindo o da vereadora Carla Ayres.
Durante a sessão, a representante do Partido dos Trabalhadores em Florianópolis subiu à tribuna para apresentar seus argumentos, que incluíram a sua autoproteção, a segurança de funcionários e funcionárias da casa legislativa e a falta de decoro do parlamentar em inúmeras ocasiões.
Assista a fala da vereadora Carla Ayres na íntegra:
Leia o voto pela cassação de Maykon Costa (PL) a seguir:
“Colegas, quero ler meu voto para que não restem dúvidas sobre meu posicionamento.
Tenho certeza que votações como as de hoje não são fáceis, simples, ou isentas de impactos. Mas, vale lembrar que até 2021 esta Câmara estava submetida a um instrumento DITATORIAL para penalizar – ou não – mandatos. Fato que sempre fui contra, inclusive, participei da elaboração do atual código de ética que tramitou por 7 anos.
A criação do Conselho foi tardia, entretanto, um aprimoramento democrático importantíssimo, não só porque foi submetido a construção e apreciação deste plenário. Mas, porque prevê possibilidades de revisões constantes; ritos; composição proporcional; exercício da ampla defesa; medidas disciplinares; e toda garantia do devido processo legal.
Talvez, efetivamente, não seja a melhor instância para se requerer “justiça”. Afinal, estando submetido ao próprio legislativo, não deixa de ser um espaço político.
Um espaço político, numa instituição representativa. Todos sustentados pelo voto popular. Instrumentos democráticos restabelecidos com muita luta e sangue de um período truculento que muitos de vocês sequer reconhecem que ocorreu; que alguns de vocês apoiam o retorno; e outros minimizam os efeitos.
A nossa história continua sendo marcada por afrontas à Democracia. E os reflexos disso afetam todas as pessoas que se submetem aos seus princípios. Há de se destacar por exemplo o absurdo de um Deputado da República homenagear um dos maiores algozes e torturador da ditadura e não ter sido punido. Eu sempre achei isso uma afronta à democracia, mas vários dos senhores não.
Não é sobre “pensar diferente”. É sobre ATITUDES anti-democráticas. E mesmo que fosse, a imunidade parlamentar e a liberdade de expressão seguem obrigatoriamente a lei e os seus limites. Esta casa e todos nós, precisamos AGIR, constantemente com ética, decoro e civilidade.
Antes do mérito, quero dizer que acho extremamente perigosa a tentativa maniqueista de tentar interpretar este processo em uma questão Gestão versus Oposição. Ao longo desta semana, me escreveram nas redes que o vereador “é o único que denuncia corrupção”. Isso é um desrespeito e uma mentira.
A tentativa de transformar o Maikon num “paladino da justiça” é uma afronta a todos, especialmente ao conjunto da oposição. Afinal, fiscalizar e denunciar é o DEVER de todos aqui e por isso que cobramos tanto nesta tribuna que os vereadores cumpram seu papel constitucional.
Quero ainda confessar que me senti desrespeitada e invadida na última semana com as tentativas sistemáticas de atores políticos da cidade, ex-vereadores, externos ao caso – em tentarem me cercar e ponderar meu voto. Nada incomoda mais uma mulher-feminista que um homem lhe chegar – por ligação, mensagem ou ao pé do ouvido e dizer: “olha Carlinha, você não está entendendo, deixa eu te explicar, veja bem…”
Estou entendendo sim! E eu não me submeto a chantagens e tentativas de convencimentos oportunistas. Minhas decisões de mandato só se submetem ao meu partido, e a decisão de hoje é uma orientação unânime da executiva do Partido dos Trabalhadores de Florianópolis.
Não me submeto nem atuo com essa prática. Jamais poderia imaginar que eu seria vítima e primeira denunciante a provocar o funcionamento do Conselho de Ética desta Casa. E todos aqui vão concordar que em nenhum momento eu interpelei nenhum de vocês para coibir seus votos. Aliás, eu nunca perguntei sequer como iriam votar.
Mesmo com discordância, precisei acatar com apreensão os meses que seguimos compartilhando plenário com quem me agarrou. Tive que lidar com constrangimento e decepção os meus mais próximos aliados desfilarem sorrisos, fotos e viagens com meu agressor.
Hoje estamos diante da apreciação e julgamento do segundo caso processado junto ao atual Código de Ética da Câmara.
E não, não estamos diante de uma disputa de ideias e opiniões. A tarde de hoje é para refletirmos sobre o decoro nesta casa. Fomos motivados por um episódio, mas não se trata só dele. É sobre entender que não cabe ao nosso exercício parlamentar perseguições, intimidações, “recados”, e até mesmo ameaças, por vezes veladas, por vezes nem tanto.
- Não cabe ao exercício parlamentar quebrar o computador de um plenário e fazer funcionárias saírem chorando do seu local de trabalho;
- Não deveria caber à essa casa o silêncio ao se trazer para dentro deste plenário um sujeito condenado por violência doméstica a intimidar uma vereadora no uso da tribuna;
- Não deveria ser naturalizado por esta casa uma vereadora ser ameaçada e as demais precisarem fazer sua escolta;
- Assim como não deveria ser aceito como natural que uma parlamentar possa ter seu corpo invadido por outro parlamentar dentro do plenário, tendo como resposta desta casa a menor pena prevista;
- Não cabe a quem se elege com voto popular transformar as dependências da Casa Legislativa num ringue.
Na minha visão, práticas como as que cito aqui, além de INDECOROSAS, representam o modus operandi do bolsonarismo e eu me recuso a normalizá-las como muitos de vocês, ao meu ver, vêm fazendo. Em todos estes casos existem duas coisas:
- A inércia frente a ATITUDES que afrontam a democracia na sua ESSÊNCIA e não só em sua forma.
- De outro, a participação nada ocasional do vereador Maikon em todas elas.
Quero deixar mais uma questão registrada. A mesa diretora anterior vai se recordar que, quando nossas atividades ainda estavam remotas, eu reportei à presidência uma série de haters e ameaças que recebia nas redes e nos meus telefones. Estas perseguições cibernéticas foram protagonizadas por um sujeito que, meses depois, foi cabo-eleitoral do Maycon e chegou a me abordar na rua.
Pois bem, eu descobri na quinta-feira passada que o vereador Maikon abriga no seu gabinete, desde novembro de 2023, a pessoa que me inseriu em grupos Bolsonaristas, em 2021. Fato a partir do qual estas ameaças iniciaram contra mim. A própria e atual assessora me procurou por duas vezes para me contar sobre isso. Coincidentemete, após correr na imprensa a possibilidade de meu voto a favor do afastamento. Eu pergunto a vocês qual é o motivo desta auto confissão agora, se não mais um movimento orquestrado de intimidação?
Independente do resultado desta votação, meu entendimento sobre este afastamento – além dos elementos que destaquei – é por segurança dos funcionários e assessorias, principalmente as mulheres, que se sentem ameaçadas (os) com tais atitudes. No meu caso, específico, diante das últimas informações é pela minha autoproteção.
É um BASTA à uma cesta recheada de posturas que afrontam o nosso decoro.
Quero lembrar que, no meu caso, muitos votaram por uma penalidade pífia porque teriam de concordar com a decisão do conselho de ética para que alguma punição fosse aplicada. Infelizmente, a lógica de hoje é a mesma. Ainda que possam compreender a cassação como desproporcional em razão dos fatos objeto do processo, há de se levar em consideração as consequências, as ameaças e as inseguranças que estes fatos provocaram. Portanto, não nos resta hoje outra alternativa, visto que a falta de punição seria totalmente descabida.”