Uso medicinal da Cannabis pode virar lei nas três capitais do sul do Brasil

Em ação conjunta, parlamentares de Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre propõem a criação de políticas municipais para o uso farmacêutico, medicinal e industrial com o medicamento.

            A população das três capitais do Sul do Brasil que sofrem com síndromes, transtornos e doenças como autismo, epilepsia, TDAH, TOC, síndrome de Tourette, Alzheimer, Parkinson, fibromialgia e insônia passam a ter uma esperança de ter a Cannabis medicinal disponível para o seu tratamento na rede pública de saúde. É o que deve acontecer se os projetos protocolados pelas vereadoras Carla Ayres (PT) de Florianópolis, Carol Dartora (PT), Professora Josete (PT), Maria Letícia (PV) e Renato Freitas (PT) de Curitiba e pelo vereador Leonel Radde (PT) de Porto Alegre, forem aprovados nas câmaras municipais das três cidades. A ação coordenada entre as parlamentares petistas busca reduzir o sofrimento de quem, além da doença, precisa enfrentar a burocracia e as dificuldades financeiras para ter acesso aos medicamentos derivados da Cannabis.

           O projeto, que tramita nas Câmaras Municipais das três capitais do sul do Brasil, partiu de uma iniciativa do vereador Leonel Radde, de Porto Alegre, após uma ampla pesquisa e debate no Rio Grande do Sul, e em seguida foi articulado conjuntamente com os mandatos em Florianópolis e Curitiba. O projeto não possui relação com a discussão sobre a legalização da maconha para fins recreativos. A proposta também busca estimular a pesquisa científica sobre o uso da Cannabis medicinal nas três capitais do Sul do Brasil, de modo a buscar novos tratamentos com a substância. Para implementação e execução do programa, poderão ser formalizadas parcerias com universidades, entidades sem fins lucrativos e instituições de pesquisa. Os protocolos e requisitos para a realização dos estudos deverão obedecer aos regulamentos de órgãos federais, como Ministério da Saúde e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

           De acordo com a vereadora Carla Ayres, este é um importante projeto de saúde pública, que busca ampliar o acesso da população a um medicamento que hoje ainda é muito restrito a pessoas com poder aquisitivo mais elevado. “Diversas pesquisas científicas publicadas nas mais importantes revistas do mundo comprovam os benefícios de medicamentos derivados da Cannabis, no tratamento de inúmeras doenças. Portanto, o Estado tem o dever de assegurar esse tratamento para reduzir o sofrimento e promover a qualidade de vida de quem hoje encontra dificuldades para conseguir essa medicação. Atualmente, a maioria dos insumos para produção de medicamentos à base de Cannabis são importados, tornando o seu custo inviável para a população de baixa renda.”.

           Carla Ayres defende ainda, que é preciso romper com a desinformação e combater o discurso anticientífico sobre o tema: “A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já autorizou o uso de alguns medicamentos a base de Cannabis no nosso país, contudo, a sua implementação como política pública tem esbarrado no discurso conservador, que se vale de fake news e da anticiência para impor uma visão distorcida sobre o tema. Esta é uma questão de saúde pública. São milhares de pessoas que poderiam tratar os sintomas e ter uma qualidade de vida muito melhor se tivessem acesso a este medicamento e se o poder público estimulasse as pesquisas com a substância.”.

           Na mesma ação, as vereadoras e vereadores também estão propondo outro projeto de lei para instituir o programa “Farmácia Viva”. A finalidade é oferecer na rede pública produtos, insumos e medicamentos fitoterápicos para tratamento da saúde, conforme normativas do Ministério da Saúde a esse respeito, em vigor desde 2010. Segundo dados da Anvisa, atualmente no Brasil existem 13 milhões de pessoas que possuem doenças crônicas para as quais substâncias extraídas da Cannabis e de outras plantas têm recomendação para seus tratamentos.

           Leonel Radde é, também, Policial Civil do Rio Grande do Sul e relata que, quando questionado como “pode um policial defender a Maconha?”, responde que “a maconha uma questão de direitos humanos e de justiça social”, afirmando que “a atual Lei de Drogas criminaliza a planta que garante o direito à qualidade de vida, ao mesmo tempo, é função do Estado garantir os direitos da sua população”. Com a repercussão dos Projetos de Lei que tramitam na Câmara de Porto Alegre, as demais bancadas do Sul do Brasil demarcaram seu posicionamento com a bandeira antiproibicionista.

           Articuladora da iniciativa na capital paranaense, Carol Dartora explica que “as duas propostas são complementares e vão contribuir nos esforços de democratização do acesso às terapias alternativas”. Segundo a vereadora, atualmente “a maioria dos insumos para produção de medicamentos à base de Cannabis são importados, o que torna os remédios muito caros”.

            Uso terapêutico

           Cannabis é o nome científico da planta conhecida popularmente como maconha. Uma das diferenças entre a droga de uso recreativo, ainda considerada ilícita no Brasil, e a utilização terapêutica está na concentração dos princípios ativos, canabidiol (CBD) e tetraidrocanabinol (THC). O primeiro está associado a resultados positivos nos tratamentos de doenças raras, dores crônicas, epilepsia, TDAH, TOC, síndrome de Tourette,  Alzheimer, Parkinsson, fibromialgia, insônia e outros, quando esses problemas não respondem aos medicamentos convencionais. Já a segunda substância é encontrada em maior concentração nos produtos denominados usualmente como maconha e que têm finalidades recreativas, ritualísticas ou culinárias. Apesar de seu potencial tóxico e de causar dependência química, o THC tem efeitos terapêuticos estudados em casos diversos, como em pacientes com AIDS e com câncer.

           Pesquisas no Brasil

           O Brasil é um dos países pioneiros nas pesquisas com Cannabis. Nas décadas de 1970 e 1980, o psiquiatra e pesquisador da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), Antonio Waldo Zuardi, foi o primeiro do mundo a demonstrar os efeitos calmantes e antipsicóticos do CBD. Mas foi só no ano passado que o primeiro extrato de canabidiol desenvolvido no Brasil chegou às farmácias, fruto de uma parceria entre a FMRP, Universidade de São Paulo (USP) e a indústria farmacêutica. O produto é fabricado no Paraná, pelo laboratório Prati-Donaduzzi, e foi liberado para comercialização pela Anvisa em abril de 2020. A venda é controlada e condicionada à apresentação de receita médica.

           Congresso Nacional

           Apesar dos estudos científicos que comprovam a eficácia da substância no tratamento de diversas doenças e o potencial econômico dessa finalidade, a discussão em torno do plantio para uso científico e medicinal da Cannabis provoca debates no Brasil. O tema está em discussão no Congresso Nacional e, no início deste mês, o Projeto de Lei 399/15, que regulamenta o cultivo controlado de Cannabis para fins exclusivamente medicinais, veterinários, científicos e industriais e a comercialização de medicamentos que contenham extratos, substratos ou partes da planta, foi aprovado na comissão especial que analisa o tema.

           Confira o andamento da tramitação dos projetos:

Câmara Municipal de Curitiba: https://www.cmc.pr.gov.br/wspl/sistema/ProposicaoDetalhesForm.do?select_action=&ordena=005.00177.2021&pro_id=437566&popup=s&chamado_por_link&pesquisa=Cannabis

Câmara Municipal de Florianópolis: https://paperlessgov-editor.cmf.sc.gov.br/visualizador/publico/anexo/14491 e https://paperlessgov-editor.cmf.sc.gov.br/visualizador/publico/anexo/14494

Câmara Municipal de Porto Alegre: https://camarapoa.rs.gov.br/processos/136605

Uso medicinal da Cannabis pode virar lei nas três capitais do sul do Brasil
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